Charles Bukowski: O Grande Expoente da Literatura Marginal Americana

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Charles Bukowski, cujo nome de batismo era Heinrich Karl Bukowski, foi indubitavelmente um dos mais criativos, pungentes e prolíficos escritores norte-americanos do século 20 – autor de seis romances, diversos livros de contos e dezenas de livros de poesia -, sendo considerado um dos maiores e mais influentes nomes da literatura marginal contemporânea.

Nascido na Alemanha em 16 de agosto de 1920, ainda na infância Charles Bukowski se mudou com os seus pais para os Estados Unidos. A família se estabeleceu em Los Angeles, cidade que se tornaria parte do folclore pessoal do autor, e serviria de cenário para praticamente toda a sua ficção.

Sua obra, extremamente autobiográfica, retrata um indivíduo marcado pelas exasperações, extenuações e dificuldades da vida. Apesar de muitas vezes estar saturada de uma densidade tão lancinante quanto aflitiva, sua literatura está carregada de ironia, refinamento e ácido humor negro, o que torna seu estilo particularmente característico, fácil de reconhecer após a leitura de alguns livros. Depois de ficar familiarizado com a literatura de Charles Bukowski, é impossível não desejar ler mais livros do autor. Com um estilo excepcionalmente marcante, efusivo, condoído e inimitável, Bukowski se revela sem pudores ao leitor, com uma prosa direta, lancinante e dramática, que mostra a crueldade perniciosa da vida, sem negligenciar as belezas elementares da natureza humana, analisadas e expostas, evidentemente, de formas peculiarmente cínicas, mas ao mesmo tempo relativamente sublimes.

Bukowski lançou-se na literatura relativamente cedo. Na adolescência, já escrevia; a criatividade literária era o recurso de sobrevivência que o jovem Bukowski tinha à sua disposição para suportar o seu pai, um homem agressivo, hostil e autoritário, que frequentemente o espancava sem motivos. A negligência e a passividade de sua mãe contra todos os abusos que sofria deixavam o jovem Bukowski profundamente magoado. Para ele, escrever se tornou uma atividade fundamental, um escapismo que lhe permitia suportar as agruras da existência.

Ostensivamente sabotado por seu pai – que frequentemente rasgava os seus manuscritos, fato que Bukowski recorda com certa aflição e amargura em suas narrativas literárias -, o jovem rapaz conseguiu de certa forma perseverar, e publicou o seu primeiro conto em uma revista aos vinte e quatro anos de idade. Infelizmente, as dificuldades e a indiferença do mundo editorial o deixaram demasiadamente exasperado, de tal forma que Bukowski se tornou cético para as reais possibilidades de uma carreira literária. Por um bom tempo, portanto – praticamente uma década -, Bukowski não escreveu nem publicou absolutamente nada.

Na segunda metade da década de 1950, no entanto – depois de sofrer com uma úlcera quase fatal, que por pouco não o matou – Bukowski voltou a escrever; dessa vez, no entanto, altamente inspirado e motivado. A partir desse período, o autor simplesmente não parou mais. Se tornou altamente produtivo, em diversos gêneros literários.

Apesar de ter se dedicado à literatura a vida inteira, Bukowski demorou um tempo considerável para ser efetivamente reconhecido como um escritor consistente, original e talentoso. Apenas em 1969, quando estava então com quarenta e nove anos, o editor da Black Sparrow Press, John Martin, fez uma proposta para Bukowski, que então trabalhava em uma agência dos correios, solicitando ao autor que pedisse demissão do seu emprego para – mediante uma mesada de cem dólares por mês, o que equivaleria a aproximadamente seiscentos e setenta e cinco dólares em valores monetários atuais – se dedicar exclusivamente à literatura, em tempo integral.

Bukowski – que por essa época estava exaurido do seu trabalho nos correios – decidiu aceitar a proposta, para se dedicar então unicamente à literatura, pelo resto de sua vida. Em pouco tempo, ele concluiu e publicou o seu primeiro romance, intitulado Post Office. Em uma tradução literal, o título seria Agência dos Correios, mas aqui no Brasil o livro ganhou o título de Cartas na Rua.

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Neste livro, Bukowski mostra um pouco do seu coditiano como carteiro; aborda de maneira franca e direta as dificuldades da profissão e os frequentes atritos que ele tinha com o seu chefe. Muitas vezes indisciplinado e cauteloso, Bukowski – ou melhor, Henry Chinaski, o protagonista do romance, que era basicamente o alter ego do autor, personagem presente na maioria dos seus livros -, apesar de ríspido e dissimulado, estratégia que adotava para que o mundo exterior não percebesse sua natureza frágil e sensível, era na verdade uma alma simples e gentil. Para que ficasse satisfeito e contente, só precisava de uma boa refeição e de doses cavalares de álcool. Ainda que não seja um dos seus melhores livros, Cartas na Rua definitivamente desperta a curiosidade do leitor, que fica ávido por conhecer outras obras de Charles Bukowski.

Conforme pôde se dedicar exclusivamente ao pleno exercício da escrita, Bukowski – além de ficar cada vez melhor – foi adquirindo gradualmente mais notoriedade; ele já era relativamente conhecido por um pequeno público entusiasta de revistas literárias underground quando passou a dedicar-se à literatura em tempo integral, mas quando começou a publicar seus romances e seus livros de contos e poesias com regularidade, não demorou muito tempo para se tornar uma grande celebridade literária. Primeiro nos Estados Unidos, depois na Alemanha, e por conseguinte, no resto do mundo.

Na segunda metade da década de 1980, o famoso diretor de filmes Barbet Schroeder solicitou a Bukowski que escrevesse o roteiro para um filme. Ainda que não gostasse de escrever roteiros – pois preferia dedicar-se quase que exclusivamente à redação de romances, contos e poesias -, Bukowski aceitou a proposta pelo dinheiro.

A partir deste roteiro, nasceu Barfly – Condenados pelo Vício, filme estrelado por Mickey Rourke e Faye Dunaway. Lançado em 1987, o filme foi um grande sucesso. Na trama, Mickey Rourke interpreta o sempre embriagado e falastrão Henry Chinaski, um homem desiludido e desesperançado, que passa as madrugadas perambulando de bar em bar, arrumando brigas e confusão, na fútil tentativa de dar algum sentido e direcionamento para a sua vida pobre, vazia e deplorável.

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Tudo o que estava relacionado à criação do filme, desde a encomenda do roteiro solicitado por Barbet Schroeder, até o exaustivo processo de patrocínio e gravação do filme, foi magistralmente narrado por Bukowski no romance intitulado Hollywood, originalmente publicado em 1989. Ainda que os nomes dos personagens tenham sido deliberadamente alterados para evitar confusões – Barbet Schroeder é o personagem Jon Pinchot, Mickey Rourke é Jack Bledsoe, Faye Dunaway é Francine Bowers, e assim por diante -, a narrativa descreve tudo o que estava relacionado ao filme do ponto de vista de Bukowski, ao mesmo tempo que o autor revela sutilmente sua opinião sobre Hollywood e a indústria cinematográfica americana de uma forma geral.

Fazendo referência às suas insuperáveis inclinações autobiográficas – afinal, Bukowski sempre foi o seu melhor personagem -, no final do livro, sua esposa, chamada Sarah no romance, lhe pergunta “Que vai fazer agora?”, ao que Henri Chinaski responde: “Oh, diabos, vou escrever um romance sobre como se escreve um argumento e se faz um filme.”

Bukowski, ao longo de sua vida, publicou mais de sessenta livros. Seus romances, no entanto, são os mais conhecidos. Além dos já mencionados, Factótum, Mulheres, Misto-quente e Pulp também são icônicos na vasta e fascinante bibliografia do autor. Dos seus livros de contos, destacam-se Fabulário geral do delírio cotidiano, Crônica de um amor louco (ambos foram publicados pela primeira vez em 1972, em um único volume, intitulado Ereções, Ejaculações e Exibicionismos) e Ao sul de lugar nenhum.

Para quem nunca leu, mas está curioso para ler Bukowski, Misto-quente é um excelente ponto de partida. Apesar de ser o seu romance mais extenso, aborda a vida do autor desde a infância, passando pela adolescência e indo até o princípio de sua vida adulta, sendo ostensivamente abrangente nos seus anos de formação, fazendo o leitor compreender com pungente sensibilidade sob quais circunstâncias se desenvolveram o caráter e a personalidade deste magnífico e imponderável ícone da literatura americana.

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Charles Bukowski foi, sem dúvida nenhuma, um autor formidável, que aproximou a literatura do cidadão comum. Rebelde, antiacadêmico, direto, informal, mas muito expressivo e não raro fatalista – com um prosa direta e simples, porém plena de melancólica e virtuosa sensibilidade -, Bukowski permanece sendo uma expressiva e inigualável força singular no panteão literário americano.

Apesar de ser até hoje ignorado pela crítica, o sucesso de público que o autor conquistou fala por si só. Tendo vendido milhões de exemplares dos seus livros – que foram traduzidos e publicados em dezenas de idiomas diferentes pelo mundo afora —, a originalidade de sua prosa e a sinceridade furiosa de sua vitalidade criativa são qualidades fundamentalmente arrebatadoras, que cativam qualquer leitor, da primeira à última página, de qualquer um de seus livros.

Depois de uma vida terrivelmente atribulada – que lhe outorgou o sucesso tardio por qualidades literárias excepcionalmente vibrantes e singulares -, Charles Bukowski morreu de leucemia em 9 de março de 1994, aos setenta e três anos. Morria o homem para nascer a lenda literária, que viverá eternamente no panteão da literatura americana, como um dos mais originais, pungentes e arrebatadores expoentes da literatura marginal que o mundo já conheceu.

Autor: Wagner Hertzog.

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