Videogames + Hollywood: aonde essa brincadeira quer chegar?
Ah, claro, o motivo desse texto é o gameThe Order: 1886, lançado na semana passada para Playstation 4. Mas os desdobramentos vão longe meu amigo. Arruma aí o seu assento, fique bem confortável, tire seus sapatos, coloque uma música relaxante. Vem comigo…
O namoro entre videogames e hollywood é bem antigo, né? A indústria de entretenimento eletrônico e os estúdios de Hollywood vem tentando “sair juntos” faz tempo. Desde os tempos do nosso saudoso Atari 2600, em meados da década de 70 e início de 80. Ah, não resisti e vou falar e também não me julgue por isso: BONS TEMPOS!
E era um namoro romântico pra caramba. Ficava bem visível através das capas dos cartuchos da época, que sempre atiçavam a minha imaginação. Mas, quando começava a jogar, via que os games não passavam de um amontoado de pixels mesmo. Mas, mesmo assim, era divertido demais. Lógico, eu enxergava muito além dos pixels 🙂
O INÍCIO DO RELACIONAMENTO E DAS “DRS”
Mas naquele tempo o relacionamento entre as duas indústrias não vinha dando muito certo, sabe? O game do filme Gremlins foi um desastre em vendas assim como E.T. O Extraterrestre. Acreditava-se que o fato de produzir um jogo baseado em um filme seria garantia de sucesso. Simples assim. Isso continuou a acontecer durante muito tempo e até hoje vemos produtoras pagando milhões em licenciamento para fazer títulos baseados em longas de sucesso.
Como grande parte desse investimento acaba sendo gasto em licenciamento, pouco resta para ser investido na equipe que realmente vai criar o produto, ou seja, no que realmente interessa. O resultado? Games como Enter the Matrix (PC, PS2, Gamecube, Xbox), baseado no filme Matrix, Iron Man (Xbox360/PS3), Friday the 13th (NES), Charlie’s Angels (PS2/Gamecube) enfim, a lista é enorme. Do mesmo tamanho do fiasco que foram esses jogos 🙂
Esse tipo de produto continuará a chegar ao mercado. Faz parte do business. Até porque alguns até acabam vendendo bem, impulsionados pelo sucesso nas bilheterias das produções nas quais são baseados. Mas é interessante também repararmos em outro movimento. Eu diria que começou a acontecer na época dos também saudosos e queridos Mega Drive/Genesis e Super Nintendo.
FILMES INTERATIVOS: OK, MAS E A TAL DA SUBSTÂNCIA?
Lembra de Lethal Enforcers, uma produção da Konami? O game tinha um cenário completamente digitalizado. Dizíamos na época: “Uau, perfeição. É um filme!” Mas era um simples game de tiro. Impressionava demais pra época pois era tecnicamente impossível de reproduzir sem digitalização.
Foi mais ou menos nesse período que também vimos o famoso arcade Time Traveler, que era baseado em laser disc e rodava as animações dos personagens previamente captadas direto do disco. Era tudo pré-gravado. Mas o truque chamou a atenção de muita gente. Eu mesmo… E tinha também Mad Dog McCree e Phantasmagoria que também seguiram a linha “filme interativo”. Esse último, um hit estrondoso. Mas ambos não tinham lá muita substância, vai. Valia mais pela inovação mesmo.
Mas aí chegaram novos consoles. Novo hardware. Aí começamos a ver games reais cada vez mais parecidos com filmes. Nada de pré captação de imagens, restringindo-as apenas a técnicas de MoCap. Os consoles começaram a esbanjar potencial para renderizar cenários tão sofisticados que o escopo de possibilidades se ampliou bastante. E quando digo bastante…
OS “STEVEN SPIELBERGS” DO MERCADO DE GAMES
Jogos com roteiros e personagens complexos, histórias cada vez mais interessantes, direção artística. Diretores ficaram famosos: Sinji Mikami (Resident Evil), Hideo Kojima (Metal Gear Solid), Ken Levine (Bioshock), Kazunori Yamauchi (Gran Turismo), David Cage (Heavy Rain/Beyond: Two Souls) e Neil Druckmann (The Last of Us) são apenas alguns exemplos dos “Steven Spielbergs” desse mercado.
A trilogia Uncharted, da conceituada produtora Naughty Dog é praticamente uma versão da série Indiana Jones para o Playstation 3. A diferença? Roteiro, mundo e personagens próprios. Aí tivemos games como Heavy Rain e Beyond: Two Souls. Esses dois estão mais para filmes interativos do que games em si. A diferença é que agora há mais partes jogáveis e, como já disse, gráficos em real time.
Aí chegamos no “HOJE”. Tivemos o polêmico lançamento de The Order: 1886, mega produção exclusiva para o Playstation 4. O game conta com gráficos incríveis, criados para exibir o poder de processamento da nova máquina da Sony. A crítica especializada (leia esse review do IGN Brasil, pois está bastante completo) e os jogadores não pouparam elogios ao visual do game. Sabe aquela loira sem photoshop que você não acredita ser natural? Pois é, uma belezinha.
O QUE IMPORTA? JOGABILIDAE OU PARTE TÉCNICA?
Porém, consumidores de todo o mundo reclamaram demais quando o assunto passa a ser a jogabilidade, que é bastante restrita e praticamente guia o jogador durante todo o tempo, exibindo na tela os comandos que precisam ser dados em determinado período de tempo. Sim, os polêmicos Quick Time Events. Você os ama? Odeia? O que eu acho? Bem, eu tenho DR com eles frequentemente.
Em The Order: 1886, tudo acontece para fazer parecer que o jogador está dentro de um filme. Ainda estamos perseguindo isso. E agora a coisa ficou bem séria. Assim como Heavy Rain e Beyond: Two Souls. O problema é que a galerinha do marketing da Ready at Dawn, produtora do título, gerou expectativas irreais.
Não ficou claro durante a divulgação que o foco seria menos ação e jogabilidade e sim mais “sorria, você está dentro de um filme, olha que incrível”. Há grandes cutscenes, onde você fica com o controle nas mãos apenas assistindo o que acontece na tela. O vídeo aí embaixo tem mais de 6 horas de jogabilidade. Dá uma olhadinha, vai.
Em The Order: 1886 é assim: você até joga. Joga um pouco mais. Assiste denovo. Joga um pouco. Assiste. Assiste e, assiste. Isso me faz lembrar de algumas perguntas que sempre volto a fazer pra mim, de tempos em tempos: queremos realmente que os games tornem-se cada vez mais reais? Ou queremos que eles sirvam apenas como uma mera fuga da realidade? Afinal, qual o problema do escapismo por um determinado período de tempo? Heim? #QuemNunca?
O que importa é a jogabilidade e a diversão ou a parte técnica? “Ai que jogo feio, olha as feições do personagens, que horrível”. É necessário uma grande história pra que o game seja um hit? Lembro de vários games clássicos que até hoje são lembrado e muito jogados: Super Mario World, Enduro, Pacman, River Raid, Pitfall, só pra lista não ficar tão longa. Nenhum desses tinha grande história. Aliás, o único que esboçava querer ter uma história – mesmo que simplérrima – era Super Mario World. E todos estão muito distante da realidade em todos os termos, certo? Ou você vive naqueles mundos do Super Mário? Se sim, me explica como chegar lá 🙂
COMO A INDÚSTRIA VAI CONSEGUIR EVOLUIR AGORA? JÁ NÃO FIZEMOS ESSA PERGUNTA HÁ 10, 20 ANOS?
Louco né? E pensa agora: já imaginou o que vai acontecer quando não conseguirmos mais distinguir um game de um filme? Quando isso acontecer, será que teremos uma boa jogabilidade ou tudo será feito somente em prol de barulhos e explosões na tela? Afinal, as pessoas querem espetáculo e também é preciso vender novos consoles e hardwares mais potentes. O business precisa girar.
Ok, é bem provável que não tenhamos mais consoles em um breve futuro, já que o processamento de games tende a acontecer nas nuvens. Mas aí será cobrado um valor maior pra você poder ter acesso a gráficos mais reais. E sempre haverá público pra isso. Mas, voltando a pergunta: e quando não for mais possível distinguir entre game e filme? Vamos para o cinema jogar? Como essa indústria vai evoluir?
Talvez a resposta sejam os desenvolvedores indie e os games mobile. Sim, os games indies, principalmente produções mobile, estão fazendo o caminho inverso de toda essa loucura. Games com visual e jogabilidade retrô, totalmente pixelados, com músicas sintetizadas. Eles tem vendido aos montes e agradando um público bem distinto. A SEGA já comunicou que vai se focar exclusivamente neles. Daqui a pouco a Nintendo deve começar a namorar o mercado mobile também.
ALÔ CALL OF DUTY. ALÔ BATTLEFIELD
Talvez seja isso mesmo. Teremos os extremos proporcionados pelas produtoras de games sempre namorando com HollyWood e os games simples, para aqueles que só querem se divertir durante 5 minutos. Mas aí me vem outra pergunta: o quanto mais caro tem ficado produzir um game? Se estamos nos aproximando cada vez mais de produções cinematográficas (GTA V custou mais que vários blockbusters de Hollywood), o tempo de produzir um game tende a aumentar.
E a ficar mais caro. E o risco pra produtora aumenta proporcionalmente. Desse jeito, poucas vão querer realmente inovar, resolvendo apostar nas velhas fórmulas e franquias, somente melhorando o visual. Afinal, é preciso garantir os lucros. Tem os investidores também, aquela coisa toda. Ah, vamos aproveitar e mandar um alô pra Call of Duty, Battlefield…
Ah, e tem também os óculos de Realidade Virtual, né? Eles chegam em um momento onde as duas indústrias estão mais próximas que nunca. Mas vamos lá, talvez pouco irá importar definir o que é uma experiência interativa e o que é um filme. A imersão proporcionada por esses óculos e produções interativas milionárias será tão grande que o conceito de game talvez fique ultrapassado. Talvez tudo se torne um jogo. Gamificação da vida.
Observar os desdobramentos dessa indústria magnífica, está cada vez mais interessante e excitante. De um lado vemos sofisticação sem precedentes. De outro, uma simplicidade que cativa. Eu confesso que gosto de sofisticação mas carrego simplicidade em meu mobile device, bem ali no meu bolso 🙂
E você?
Rodrigo Cunha96 Posts
Publicitário, geek, louco por cinema, música, games, livros e boas idéias nas horas vagas e não vagas. Tem medo de fazer compras em NY e beber num PUB de Londres e nunca mais voltar.
0 Comentários