Uma reflexão sobre a masculinidade

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Você já assistiu ao filme Gladiador? Caso não tenha assistido, eu recomendo fortemente que assista. Caso tenha visto o filme, recomendo que o assista de novo. E então de novo e de novo. O motivo é simples: o personagem de Russel Crowe apresenta exatamente os princípios de Masculinidade que você deveria nutrir.

A história do que reconhecemos como Masculinidade teve início na Grécia e na Roma antigas, e aqueles padrões de comportamento foram sendo progressivamente transformados e adaptados a partir dos seus encontros com as sociedades bárbaras, a corte medieval, o Renascimento, o colonialismo, a Revolução Industrial, a invenção da infância e da adolescência, os movimentos trabalhistas, o feminismo, a liberdade sexual e etc.

Sem dúvida alguma, estes conceitos podem parecer estranhos, agressivos, irracionais, piegas, ou no mínimo – e à primeira vista – desafinados com a sofisticação da sociedade moderna. Mas nem por isso deixaram de nos fazer falta.

Os gregos associavam a Masculinidade à virilidade, à bravura e audácia no campo de batalha. Este modo operacional era ensinado inclusive às mulheres, que também deveriam pensar e agir com fibra e resiliência. Um pouco mais tarde, os romanos elevaram esses padrões.

No Império Romano, possuir Masculinidade significava não apenas ter “poder sexual”, “força na luta” ou “capacidade reprodutora”, mas ser eficaz, assertivo, fisicamente capaz e virtuoso. A Masculinidade dos romanos deveria manifestar-se, intelectual e emocionalmente, como leveza vigorosa e coragem prudente. Era um ideal de auto-confiança, maturidade, grandeza e domínio sobre si mesmo que poderia ser compartilhado por todos, em benefício de todos.

Veja que, enquanto os Gregos enfatizavam a virilidade, os Romanos adicionaram complexas características físicas e intelectuais ao conceito. O Másculo deveria ser alto, musculoso, belo, bronzeado, de boas proporções, e ao mesmo tempo ético, moderado e possuir um vigor intenso mantido sob controle – como um exército pronto para qualquer batalha, mas silencioso em tempos de paz. Se o homem se tornasse muito agressivo, ou muito emocional ou muito embrutecido, sua Masculinidade estaria comprometida.

Somados gregos e romanos, é fácil entender que tudo se trata de um equilíbrio inteligente entre Poder, Sabedoria e Honra. Como anda sua balança?

O Trator e o Guindaste: Masculinidade versus Virilidade

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Como se fossem duas máquinas de trabalho pesado, Masculinidade e Virilidade parecem ser coisas superficialmente semelhantes, mas guardam diferenças profundas entre si, quase ao ponto do antagonismo.

Retornando ao filme Gladiador, o personagem de Russel Crowe, com seus modos quietos e temperados, representa o ideal de Masculinidade, ao passo que o personagem de Joaquin Phoenix, o Imperador Commodus Maximus, representa a Virilidade. Commodus é sensual, manipulador, poderoso, inteligente e inegavelmente masculino. Ainda assim, sua paixão por controle o domina, levando-o a um comportamento paradoxal e indesejável. Ele representa a figura da Virilidade eximida dos ideais de Masculinidade.

Histórica e etimologicamente, a Virilidade sempre se mostrou essencialmente misógina quando comparada à Masculinidade: a ideia de uma superioridade masculina não pode existir sem uma dose de desprezo pelas mulheres. Com tudo isso, a Virilidade deixou de ser um traço desejável do caráter e passou a ser considerada um drama perverso, uma maldição e uma fragilidade do ego masculino.

Apesar de toda essa distinção, Masculinidade e Virilidade são ambas ferramentas cruciais na formação do seu caráter. O Homem deve ser Másculo e Viril, e isso não significa que você tenha que ser necessariamente mau, manipulador, interesseiro ou sexista.

Considere o personagem de James Bond. Ele mescla perfeitamente as duas qualidades em uma coisa só. Bond é Másculo e Viril ao mesmo tempo. Na maioria dos filmes da série, o vilão tenta provocar a ira irracional de Bond, mas o eterno 007 possui uma virilidade estóica, e o vilão em geral é vitimado pela sua própria ganância e perversidade.

Nem a Masculinidade, tampouco a Virilidade, são “inatas”, ainda que a sociedade pense assim. Homens nascem meninos, não Homens. Eles deverão construir sua Masculinidade e conquistar sua Virilidade – e esta deveria ser a ordem natural das coisas: primeiro, a Masculinidade; e então a Virilidade.

O problema é que a Virilidade é ensinada e apreendida de um modo bem mais fácil que a Masculinidade. Na maioria das interações masculinas – desde os times de futebol no final de semana até o serviço militar obrigatório -, o homem é estimulado a desenvolver principalmente seu lado viril. E isto é um erro.

Antes do vigor selvagem da Virilidade, os meninos deveriam aprender os ideais de Masculinidade. Eles deveriam aprender a batalhar sem ódio, a se fazer ouvir sem gritar. Deveriam aprender disciplina, circunspecção, moral, justiça, altruísmo e generosidade, e então tornarem-se viris dentro destes moldes.

A Masculinidade Moderna

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Por volta dos Séculos XVIII e XIX, na Europa, os ideais de Masculinidade (e a partir daqui, por didatismo, vamos incluir sob o termo Masculinidade todas manifestações da Virilidade também, ok?) se tornaram ainda mais confusos e quase impossíveis de serem alcançados.

Em “History of Virility”, o historiador francês Alain Corbin elaborou uma coletânea das características que se esperava do homem másculo-viril no começo da Idade Moderna:

“(Ele) Não hesita em lançar-se no dia da batalha; coloca sua própria vida em risco para salvar seus camaradas; tem tudo o que se espera de um herói; não demonstra ambição; se mostra indiferente ao prestígio e às homenagens; não busca a superioridade; não tem dificuldade em manter suas emoções sob controle; demonstra confiança no modo de falar e escrever; não se esquiva dos interesses de uma mulher; e ele faz sexo com ardor”.

Franz Kafka ficaria com inveja! Como colocar-se à altura de uma profusão de paradoxos como essa? Me diga: como você se lança à batalha para salvar a vida de seu amigo sem buscar superioridade sobre o inimigo? Como você faz sexo com ardor mantendo suas emoções sob controle? E pensar que qualquer passo fora dessa lista classificaria você como Não-Viril ou Não-Másculo… ferrou.

O culto à Masculinidade, retirado de sua nobreza original e deturpado para obedecer a vontade de lideranças egocêntricas delirantes, foi em grande parte responsável por quase todos os conflitos desastrosos do Século XX. A Masculinidade terminou associada a genocídios, diásporas, assassinatos, guerras, mortes em combate, perdas, sofrimento, e então reduzida à percepção da vulnerabilidade masculina e a uma cultura de paternalismos e condescendências a essa vulnerabilidade.

Simultaneamente, o estilo de vida mais urbano e sobretudo o empoderamento feminino terminaram de fazer o serviço e enterrar em uma cova funda o apreço pelo Másculo e pelo Viril. Sobre o túmulo da Masculinidade, como que para impedir que ela se manifestasse neste ou em outro mundo, colocaram uma lápide onde se lê um nome terrível: Machismo.

Ainda assim, surpreendentemente, a Masculinidade resiste no centro da cultura masculina. Basta folhear uma revista ou site voltado para homens e você verá que a identidade masculina continua sendo é uma negociação entre disciplina e vigor. Ainda existe um respeito especial por homens que dominam outros dominando-se a si mesmos.

Venerada bem discretamente e à sombra do rótulo perverso do Machismo, a Masculinidade atual procura apresentar-se com um tom mais gentil e uma intensidade mais amena. Ela promete produzir menos problemas, ser mais democrática e nada misógina.

O Homem moderno levanta pesos na academia ao lado de mulheres que fazem o mesmo; aceita pilotar uma vespa ou uma biz de 50 cilindradas e idolatra a disciplina dos chefs de cozinha. Os homens estão tentando recuperar o espaço perdido expressando sua Masculinidade de formas mais inofensivas.

Apesar dessas tentativas tímidas, a Masculinidade está se tornando algo que os meninos imitam dos filmes. Como observado por Camila Paglia, “não sobrou nada, não existem mais espaços para a virilidade e os jovens não tem mais em quem se espelhar no mundo real”.

Alardear Masculinidade ou mostrar-se Viril trornaram-se atitudes veementemente reprimidas. Em um mundo fatiado entre Feministas, Homossexuais, Bissexuais, Transexuais e Metrossexuais, dizer-se um Homem Heterossexual orgulhoso de sua Masculinidade é pior que tatuar o número 666 na testa, colocar-se vestido de capeta na frente do Papa em plena missa de Ano Novo e vomitar um líquido verde sobre Sua Santidade bem na frente das câmeras.

Em pleno Séxulo XXI, nós, os machos de nossa espécie, temos que vencer essa estranha nuvem de vigilância que nos ameaça com desconfiança e vergonha por termos nascido Homens. Mas, se o mundo necessita diversidade e tem espaço para todos, ele certamente precisará de Homens. Homens Masculinos. Homens como você.

A Virilidade Tóxica

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Talvez o problema da Masculinidade Moderna esteja, como bem viu Luke Skywalker, no lado negro da força. Existe um extremo que faz um barulho desgraçado e que deve ser evitado a todo custo: a Virilidade Tóxica.

Boa parte das definições de Masculinidade super-enfatizam os aspectos de força e dominância, simplificando as diferenças entre homens & mulheres ao mesmo tempo em que ignora as diferentes manifestações de Masculinidade dentro de diferentes grupos de homens: todo Homem é um homem mas nem todo Homem é um Homem como o outro Homem é.

Além disso, a maioria dos textos sobre Masculinidade se desenrola como se as mulheres não fossem uma parte relevante da análise e observam apenas o interior do homem isoladamente ou suas interações com outros homens. As observações e conceitos daí derivados só pioram a noção que se tem de como a Masculinidade pode ser tóxica e misógina, quando na verdade ela está muito distante disso.

Por estes e outros motivos, eu não tenho muita simpatia pelo mito do Homem Alfa. Ele transmite um conselho do tipo “seja um idiota por toda a sua vida e você terá todas as bucetas que quiser, garantido!”. E esse mito imbecil vende livros e programas de condicionamento que são comprados por homens desesperados por uma foda.

O Mito do Alfa ou o Mito do Homem Dominante prostituem a Masculinidade e envenenam-na com pré-conceitos tóxicos, transformando a mulher no objetivo máximo de sua existência e um mero um alvo para o seu pinto. Sério que você acha que viver como um Homem é pautar sua vida pela validação de uma mulher? Sua existência não é um teste para saber quem ou quantas você levou para a cama. Sua existência é porra de uma montanha que você tem que construir e descobrir o quão alto pode chegar.

Conquistas femininas farão parte dessa construção, uma parte importante até, e falaremos um bocado sobre relacionamento por aqui, mas de modo algum você deve sequer pensar que foder mulheres é o propósito maior de sua vida. Se você pensa assim, vá bater uma punheta e leia tudo de novo.

A Sociedade Emasculadora

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Na outra ponta do ringue da Virilidade Tóxica encontramos seu maior adversário: a Sociedade Emasculadora. A essência do que significa ser Homem tem sido rotineiramente atacada por manifestações ilimitadas de autoexpressão e autonomia pessoal.

Em toda a nossa volta, a ebulição de mudanças sociais feminilizantes e as mensagens plurais da mídia tem causado pandemônio no que entendíamos como Gênero. A bem da verdade, o mundo pós-Segunda Guerra Mundial derrubou o entusiasmo viril pela proeza guerreira e extinguiu a busca heróica do sacrifício e da glória.

Ao se referir ao modo como a castração das virtudes masculinas ameaça criar uma desestabilização maciça do tecido social – pois cada vez menos e menos Homens estão sendo formados para preencher postos de trabalho tradicionalmente masculinas -, a ex-feminista Camille Paglia setenciou: “o que estamos vendo é como uma civilização pode cometer suicídio”. .

As expectativas tradicionais sobre “como ser Homem” passaram a ser consideradas opressivas, limitantes e intoleráveis, e meninos e homens adultos jovens heterossexuais passaram a ter que nadar contra essa corrente, ao mesmo tempo em que procuram desesperadamente por modelos e respostas urgentes para suas dúvidas sobre identidade, deveres e incumbências masculinas. Nesse furor, alguns se deixam seduzir por distorções grosseiras e assumem posturas inseguras ou brutalizadas – um tipo de Virilidade Tóxica -, e todos ficam sem compreender as peculiaridades implícitas nos ideais de Masculinidade.

Vivemos essa cultura estranha que sistematicamente degrada a virilidade. Nossos valores involuíram a um tal ponto em que a sociedade espera que o homem aceite de bom grado o papel de serviçal infantilizado, assistente sensível, subserviente e emasculado.

Do outro lado, a mesma sociedade há décadas vem ensinando à mulher que ser “esperta e descolada” significa ser “rude e debochada” em relação à Masculinidade.

Não muito tempo atrás, eu estava na fila do cinema e ouvi duas mulheres conversando:
– Puxa, amiga, tempo que não te vejo!
– Tem mesmo. Terminei ficando mais em casa no final da gravidez. Mas graças a deus correu tudo bem e ela nasceu com saúde.
– Quer dizer que você tinha um filho e agora teve uma filhinha?
– Sim.
– Puxa, que sorte, você ficou com um casal! Apesar de quê, criar uma menina é bem mais difícil que criar um menino, né?

Fiquei pensando com meus botões: em que Século essas mulheres vivem?

Porque, de onde eu enxergo, criar um menino é tarefa das mais difíceis nos dias de hoje: tudo que um menino faz e diz e pensa e sente é considerado completamente errado do ponto de vista de nossa sociedade polissexual.

Veja: os Homens tem essa inclinação surpreendente para serem e se comportarem como Homens, mas este traço de personalidade vem sendo tratado como uma espécie de maldição pelos padrões de aceitação social atuais.

O resultado dessa distorção da Masculinidade está produzindo uma geração de homens jovens que serão inuteis como Homens, pois foram ensinados desde a tenra infância a negar e repelir cada um de seus instintos biológicos. Então, depois que tivermos destruído a virilidade desses meninos, nós, como sociedade, nos queixaremos que os homens não têm mais ímpeto, bravura, ambição, resiliência, estoicismo, instinto protetor ou “pegada”.

Não há nada engraçado nisso. É, sim, preocupante.

Colaboração: Alessandro Loila.

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